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A ADMISSIBILIDADE DO MANDADO DE SEGURANÇA DIANTE DOS FUNDOS DE PENSÃO: O CASO PED PETROS DE 2015/17

Atualizado: 1 de nov. de 2021













Escrito por Leonardo Condurú (15/03/2019, revisado em 16/09/2019)

I. O que dizem alguns advogados e apoiadores da Petros sobre o Mandado de Segurança, que vêm sendo replicadas em tribunais e muitas vezes encampadas por “juízes”:


i) “A Petros é uma empresa privada, portanto não cabe o MS”...


ii)“O MS não se aplica a autoridades que exerçam funções de gestão comercial ou de vendas de empresas estatais”.


iii) “Diante da impossibilidade prevista na Constituição e na Lei regedora do Mandado de Segurança (sic) de se interpor mandado de segurança em face de dirigente de pessoa jurídica de direito privado que não exerça função delegada pela União ou qualquer outro ente federativo reconhecido pelo STF, não vejo o Mandado de Segurança como meio hábil e seguro para se questionar o Plano de Equacionamento”.


O que há de verdade nessas ilações? Seriam meros interesses comerciais e financeiros por trás de eventuais ganhos de advogados que patrocinam causas de participantes da Petros, via sucumbência — ou a facilitação do contencioso em juízo, em favor dos poderosos?


II. Sobre o Mandado de Segurança


O MS é garantia fundamental que o indivíduo tem à sua disposição para proteger direito líquido e certo que foi violado ou que está sob ameaça de violação.



É uma ação constitucional, de natureza civil e procedimento especial. A natureza civil do Mandado de Segurança independe do tipo de ato contra o qual ele é impetrado. Assim, todo MS é ação civil, mesmo que impetrado contra ato de juiz criminal, em processo penal.


O Mandado de Segurança possui caráter residual, sendo utilizado quando o direito violado não pode ser amparado por habeas corpus ou habeas data. Em outras palavras, quando o direito violado puder ser protegido por habeas corpus ou habeas data não será cabível mandado de segurança.


Exemplos de aplicação do Mandado de Segurança:


Exemplo 01: O Diretor de uma escola pública, sem qualquer motivação, se nega a autorizar a matrícula de uma criança no ensino fundamental. Nessa situação, é cabível mandado de segurança para assegurar o direito líquido e certo à educação.


Exemplo 02: O PED Petros de 2015/17, arbitrado em R$27,7 bilhões, tal como apresentado aos beneficiários do PPSP pela própria Petros, administradora e gestora fiduciária do Plano.


A Petros impôs a boa parte dos participantes a cobrança de contribuições extraordinárias abusivas ou leoninas, estabelecidas unilateralmente em contrato de pagamento de dívida patrimonial financeira e mutualista, eivada de ilicitudes na sua formulação, à luz do ordenamento jurídico do País, e de responsabilidade exclusiva das patrocinadoras PB e BR.

Destarte incompatível com a boa-fé ou a equidade, o PED Petros compromete, de maneira inequívoca, a capacidade econômica e contributiva dos seus beneficiários, sendo, portanto, anulável de pleno direito e passível de MS.


Exemplo 03: Um case de sucesso. Quem não se lembra do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e do Banco Nacional da Habitação (BNH; 1964 a 1986), então agente financeiro dos investimentos na casa própria nos anos 70 e 80?


Através das entidades de poupança e empréstimo, os planos de financiamento imobiliário do SFH eram pactuados em contratos mutualistas e paritários, parecidos com o PPSP da Petros, em que eram especificadas condições de taxas dos créditos concedidos, prazos e reajustes anuais das prestações, por meio das UPCs, que eram corrigidas monetariamente.


Os contratos embutiam nas prestações, um coeficiente de acréscimo, que constituía o FCVS, um fundo compensatório de variações salariais, de caráter indenizatório às entidades de poupança e empréstimo, em caso de eventuais perdas sofridas nos reajustes.


Naquela ocasião, já nos anos 80, antes de sua extinção em 1986, o BNH recebeu uma enxurrada de ações, em Mandado de Segurança, patrocinadas por entidades, como as “associações de moradores” do tipo FAMERJ, que visavam corrigir distorções da correção monetária aplicada aos reajustes anuais das prestações, as quais, em razão do processo inflacionário, eram praticadas muito acima dos aumentos salariais anual obtidos pela maioria dos mutuários.


E a justiça foi feita, obtendo-se amplo respaldo do judiciário, em todas as instâncias, em que se fixou reajustes anuais das prestações de acordo com os reajustes salariais do mutuário e de sua categoria profissional, até o fim do contrato, de modo a proteger e a reparar direitos de todos os mutuários do SFH.


III. O Mandado de Segurança e a CF/88


Segundo o Art. 5º, LXIX, CF/88, “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo (aquele que é evidente, imediato que resulta de fatos que podem ser provados de maneira incontestável, grifo nosso), não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público”.


É relevante destacar que o que se exige MS é que os fatos sejam claros, incontestáveis. A complexidade ou controvérsia de questão jurídica não pode ser um óbice a que um juiz conceda o Mandado de Segurança. Vide SúmulaSTF nº 625 nesse sentido: “Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança”.


3.1. Ato de Autoridade


O MS é cabível contra “ato de autoridade”, seja ele uma ação ou omissão. Por óbvio, o MS será utilizado quando esse ato (administrativo, legislativo ou judicial) for praticado com abuso de poder ou quando extrapolar os limites da legalidade.


O “ato de autoridade” é aquele praticado por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Serão essas as autoridades coatoras em mandado de segurança.


Autoridades públicas são todos aqueles agentes que têm poder de decisão, o que inclui os representantes de órgãos da Administração direta e de entidades da Administração indireta (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista, além das entidades públicas de previdência complementar fechadas por estas patrocinadas).


Também são considerados autoridades públicas “os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições” (Art. 1º, § 1º, da Lei 12.016/2009).


Os administradores de empresas públicas, de sociedades de economia mista e de concessionárias de serviço público poderão ser autoridades coatoras em mandado de segurança quando praticarem atos regidos pelo direito público. Nesse sentido, não é cabível o MS contra atos de gestão comercial ou de vendas por eles praticados.


A Petros, em particular, como administradora fiduciária e gestora de recursos de fundos de investimento previdenciários, é a responsável pela custódia, controladoria de ativos e passivos e, de maneira geral, pela supervisão diligente da higidez na gestão da carteira de recursos do PPSP; e como também gestora, responde, por intermédio de seu “comitê de investimentos”, pelas decisões de aplicações e desinvestimentos adotadas pelo seu Conselho Deliberativo, sob a chancela das suas patrocinadoras.


As atribuições, competências, responsabilidades e prerrogativas inerentes ao compromisso da Petros são exercidas por servidores públicos, ou a eles equiparados, designados e/ou indicados pelas patrocinadoras, sociedades de economia mista, e não se confundem com as atividades de “gestão comercial” e/ou “de vendas” praticadas por administradores de empresas públicas, de sociedades de economia mista e de concessionárias de serviço público.


Entende-se como atos de “gestão comercial” a definição de estratégias de marketing e da política de vendas da empresa, seja ela estatal ou privada.


A “gestão de vendas” resume-se à definição de demandas e à execução da política de vendas propriamente dita.


Em múnus público evidente, como se pode observar, a Petros e os seus dirigentes equiparam-se à autoridade, conforme explicitada no art. 1º, e seu § 1º, da Lei 12.016/2009, que dispõe sobre a concessão do MS, podendo ser objeto de ação judicial neste sentido, com vistas a proteger direito líquido e certo de seus beneficiários, sempre que estes, ilegalmente ou com abuso de poder, venham a sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte da autoridade mencionada, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.


3.2. Ilegalidade ou abuso de poder


O MS é cabível contra atos eivados de ilegalidade ou praticados com abuso de poder. Por ilegalidade, entende-se a situação em que a autoridade coatora não age em conformidade com o ordenamento jurídico. Trata-se de vício próprio dos atos vinculados. O abuso de poder, por outro lado, ocorre quando a autoridade age fora dos limites de sua competência. Trata-se de vício próprio dos atos discricionários.


O MS, portanto, pode ser utilizado para confrontar atos vinculados ou atos discricionários. Segundo a doutrina, ao se referir à ilegalidade como hipótese de cabimento de Mandado de Segurança, a CF reporta-se a atos vinculados; ao se referir ao abuso de poder, reporta-se aos atos discricionários.


IV. Legitimidade Ativa em MS – Lei 12016/2009


O MS poderá ser impetrado por qualquer pessoa física (brasileiro ou estrangeiro) e qualquer pessoa jurídica (pública ou privada). Até mesmo o estrangeiro não residente poderá impetrar Mandado de Segurança.


A doutrina e a jurisprudência também reconhecem que as universalidades legais (espólio, massa falida e condomínio) e órgãos públicos despersonalizados têm legitimidade ativa para impetrar mandado de segurança.


Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer uma delas poderá requerer o mandado de segurança; é como diz o Art. 1º, § 3º, da Lei 12.016/2009.


Há um prazo para a impetração do MS: 120 (cento e vinte) dias a partir da data em que o interessado tiver conhecimento oficial do ato a ser impugnado (publicação desse ato na imprensa oficial, por exemplo).


Segundo o STF, esse prazo é decadencial (perde-se o direito ao MS depois desse tempo), não passível de suspensão ou interrupção. Diz a Súmula 632 do STF: “é constitucional lei que fixe o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança”.


V. Legitimidade Passiva em MS – Lei 12.016/2009


Não há unanimidade doutrinária nesse ponto. Alguns afirmam que a legitimidade passiva é da autoridade coatora, assim denominada aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática (Art. 6º, § 3º, da Lei 12.016/2009). Outros dizem que a autoridade coatora não é parte no processo de mandado de segurança, mas sim fonte de prova.


No polo passivo do MS, está a pessoa jurídica a que se encontra vinculada a autoridade coatora. Essa é a tendência atual da jurisprudência e da doutrina.


De acordo com o art. 6º, caput, da Lei 12.016/2009, a petição inicial do mandado de segurança deverá indicar, além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce atribuições.


5.1. Teoria da encampação


A teoria da encampação surgiu para corrigir o problema de indicação errônea de autoridade coatora em MS e a convalidação do vício processual.


Suponha que seja impetrado um MS apontando como autoridade coatora o ministro da Economia. Entretanto, o Secretário da Receita Federal é que seria, efetivamente, a autoridade coatora no mandado de segurança. Houve assim um erro na indicação da autoridade coatora por parte do impetrante. O Ministro da Economia, ao prestar suas informações, alegou sua ilegitimidade passiva, mas, ao mesmo tempo, defendeu o mérito do ato impugnado.


Nesse caso, será aplicável a teoria da encampação, não havendo necessidade de se corrigir a irregularidade na indicação da autoridade coatora.


Segundo o STJ, a aplicação da teoria da encampação e consequente convalidação do vício processual depende do cumprimento dos seguintes requisitos:


a) existência de vínculo hierárquico entre a autoridade que prestou as informações e a que ordenou a prática do ato impugnado;


b) manifestação a respeito do mérito nas informações prestadas e;


c) ausência de modificação de competência estabelecida na CF/88.


VI. O não cabimento de MS – Lei 12.016/2009


Há situações em que a jurisprudência e a legislação não admitem Mandado de Segurança. Conforme dispõe o art. 5º, da Lei 12.016/2009, não será concedido mandado de segurança quando se tratar de:


a) ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução.


b) decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo.


c) decisão judicial transitada em julgado.


Nos dois primeiros casos, havendo possibilidade de recurso suspensivo (ou seja, recurso que garante que nenhuma situação jurídica poderá ser modificada até a decisão) não cabe o uso de MS, uma vez que o direito já está protegido pela própria suspensão.


Cabe destacar, porém, que a Súmula nº 429/STF dispõe que “a existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do MS contra omissão de autoridade”. Dessa forma, mesmo existindo recurso administrativo com efeito suspensivo, se houver omissão ilegal ou abusiva da administração, será cabível o Mandado de Segurança.


O MS também não é cabível contra lei em tese, exceto se produtora de efeitos concretos.


Lei em tese é aquela que apresenta generalidade e abstração. A generalidade está presente quando a lei possui destinatários indeterminados e indetermináveis (uma lei que proteja o meio ambiente, por exemplo). Já a abstração ocorre quando a lei disciplina abstratamente (e não concretamente) as situações que estão sujeitas ao seu comando normativo.


Somente leis de efeitos concretos (semelhantes a atos administrativos, como uma lei que modifica o nome de uma rua, por exemplo) podem ser atacadas por MS. Isso porque as demais leis, em tese, não resultariam numa situação de fato, com violação ao direito líquido e certo do impetrante.

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