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EDUCAÇÃO E SISTEMA DE COTAS NO BRASIL: UMA OPINIÃO POSTA À MESA (revista em 06/10/18)
Escrito por Leonardo Condurú
Na minha opinião, um “sistema de cotas”, como o atualmente adotado no Brasil, é uma covardia inominável e discriminatória contra o povo brasileiro, sob qualquer justificativa: seja para resgatar dívida social em favor de etnias; para beneficiar segmentos de baixa renda; para indenização a grupos com baixo background educacional, ou para qualquer outra finalidade. É, na prática, um subsídio caríssimo e desnecessário que depõe contra a sociedade brasileira com inúmeras e tantas outras prioridades e carências.
O engraçado é que no Brasil “políticas públicas” dessa natureza, são quase sempre propostas por sociólogos e políticos comprometidos com minorias barulhentas de partidos populistas — em particular os que se intitulam como de esquerda, do tipo PT, PCdoB, PSOL e outros — fugindo da questão central que é discutir a educação a fundo no Brasil, a raiz de todas aquelas mazelas.
A reforma educacional para valer é necessária, mas assusta muita gente mal-intencionada que quer se perpetuar no poder às custas da desigualdade social do País, via educação de má qualidade, pobre e até insalubre em alguns casos.
Uma proposta mínima nessa direção vai aqui encaminhada. Como se sabe, a igualdade de oportunidades é o primado maior da democracia e deve começar pela educação básica, fundamental e média, de boa qualidade, pública, gratuita e extensiva a todos, sem exceções.
Nos redutos mais pobres e desassistidos impõe-se o dever de estados e municípios, com o aval e apoio da União, de se criar “escolas-lares” integrados, que funcionariam em horário integral, com apoio materno e creches, com infraestrutura física e pedagógica adequadas, alimentação saudável a todos, e ensino básico inclusivo, envolvendo-se as comunidades contempladas no apoio docente.
Nas turmas de ensino médio, funcionariam como verdadeiras “escolas de excelência” ao feitio dos colégios de aplicação, que têm se destacado fornecendo ensino de boa qualidade em algumas cidades como o Rio de Janeiro.
As áreas selecionadas para a implantação de projetos-piloto (tantos quantos necessários) seriam escolhidas por sua tipicidade: quanto maior fossem as carências das comunidades, a densidade populacional, os altos índices de violência, os baixos perfis educacionais (com indicadores de evasão escolar) e de renda, com aval nas demandas detectadas pelos censos educacionais, PNADS e outros levantamentos socioeconômicos, demográficos e educacionais.
Quando se diz ensino de excelência e inclusivo não está se pensando apenas em privilegiar a grade curricular de hoje, com ênfase nos ensinos de português, matemática, ciências, biologia, química, física, ou educação física convencionais. Trata-se aqui de preparar as crianças e jovens desassistidos, para um mundo real e competitivo longe de ser apenas um abrigo para os bem alfabetizados.
Nesse contexto, seriam incluídas disciplinas que lhes agregariam valor já nas segunda e terceira infâncias, como por exemplo: empreendedorismo, políticas públicas e projetos de mutirão comunitário; tecnologias da informação, robótica, impressoras 3d, web e redes sociais; como se aprender qualquer coisa fazendo; idiomas (pelo menos dois); noções de direito e busca por justiça; educação financeira, noções de jogos empresariais; noções de biomedicina, primeiros socorros e práticas de enfermagem; práticas de sustentabilidade ambiental, energias limpas, reciclagem de resíduos; iniciação ao agronegócio; noções de mecânica; noções e práticas de construção civil; práticas desportivas de inserção olímpica, dentre muitas outras.
Estas escolas, absolutamente disruptivas em relação aos modelos educacionais vigentes, funcionariam ainda como polos avançados de saúde pública, fornecendo-se também às mães e responsáveis pelos alunos, no âmbito das matérias curriculares e extracurriculares, toda a informação disponível e necessária para uma vida mais saudável em sociedade. Uma dessas referências seria no tocante à higiene, à aplicação de vacinas em campanhas de vacinação, e ampla informação a respeito de gravidezes precoces e/ou indesejadas, bem como a forma de impedi-las ou evitá-las, com distribuição gratuita e massiva de contraceptivos orais às meninas, às suas mães e demais mulheres dessas comunidades, que assim os desejassem.
Como se vê as sugestões vão longe e trariam junto certificados inseridos num programa valorativo, de modo a contemplar “cada aluno com pelo menos um ofício”, que poderia lhes render trabalho e renda, antes mesmo da opção pelo ensino superior, ou pelo ensino técnico de extensão; mitigando-se a possibilidade de cooptação pela indústria do crime.
A esperada redução dos indicadores de violência e a preparação de docentes ao longo do tempo poderiam contribuir para a absorção da mão de obra das comunidades locais na rodagem do programa, de modo a torná-lo autossuficiente nesse quesito.
No tocante ao ensino superior, as universidades públicas devem continuar a patrociná-los, mudando-se o enfoque: “ensino superior público de boa qualidade para todos”. Para os que podem e devem pagá-lo, com mensalidades competitivas capazes de cobrir pelo menos os custos de manutenção de cada curso; e inteiramente gratuitos para os que não podem nada com as rendas familiares disponíveis.
Na hipótese de gratuidade plena, a contrapartida natural poderia ser a “prestação de serviços profissionais e/ou comunitários”, por parte dos estudantes por ela contemplados que a entendam como justa retribuição à sua formação integral não onerosa. Neste programa estaria incluída, opcionalmente, a interiorização remunerada de profissionais, das áreas biomédica e tecnológica, por exemplo, em regiões ou cidades carentes desses profissionais, previamente definidas pelo órgão gestor do programa. As contratações se dariam por períodos regulares de seis meses, renováveis até um máximo de vinte e quatro meses.
A cobrança de mensalidades pelas universidades públicas —módicas, mas capazes de cobrir pelo menos os custos de manutenção de cada curso —, impõe-se como uma necessidade absoluta do País, frente à escassez tamanha de recursos, se este não quiser ver seus filhos subempregados e patinando na ubiquidade de oportunidades oferecidas pela economia brasileira, já em quatro décadas de estagnação.
Nos EUA, até pouco tempo atrás havia um único exemplo de universidade pública totalmente gratuita que depois de várias tentativas de se manter viva naufragou no realismo da economia de mercado globalizado. Os cinquenta estados americanos, contudo, dispõem de universidades públicas todas pagas, mas muito menos custosas do que as tradicionais particulares, estas regiamente remuneradas para deleite dos mais aquinhoados, ou bolsistas por excelência de capital humano ou por desempenho desportivo. Salvo em alguns países autoritários e populistas, é assim que a educação funciona no mundo todo. Que nos digam os coreanos do Sul!
No Brasil isto não seria diferente e dentre as vantagens oferecidas por políticas dessa natureza estariam o acesso mais amplo e democrático ao ensino superior; a criação de mais e melhores cursos, inclusive em horários noturnos; o aumento do número de vagas e, por extensão, pela concorrência, o barateamento do custo das universidades particulares de excelência, melhorando-se e aumentando-se, portanto, o acesso ao ensino superior a todos os que queiram fazê-lo, uma vez que não é obrigatório. Se é ou não uma boa ideia, depende de ampla discussão da sociedade. Mas, com ou sem retoques, aposto todas as minhas fichas de que não seria simplesmente apenas mais uma ideia.
Recentemente, o IBGE divulgou dados acerca do perfil populacional dos brasileiros, cuja população cresce em ritmo mais lento e envelhece mais acentuadamente, esperando-se para o ano de 2035 a entrada do Brasil no rol daqueles países com crescimento populacional zero. O que talvez possa representar uma boa oportunidade para aplicação de recursos públicos em programas inclusivos, como os aqui sugeridos, que tenderiam a ser mais previsíveis e eventualmente menos gravosos ao erário ao longo do tempo, inclusive pela reciprocidade passível de ser adotada com a gratuidade plena concedida aos estudantes carentes do ensino superior.
Os projetos educacionais bem-sucedidos numa ou noutra comunidade serviriam como benchmarks para extensão do programa a todos os estados e municípios que queiram trilhar nesse caminho, buscando-se, quiçá, a massificação de educação de boa qualidade a todos os brasileiros, e que possa permitir ao País a busca de mais e melhores colocações no pódio do IDH das nações.
* Leonardo Condurú
Economista aposentado da BR Distribuidora e consultor econômico independente.
E-mail: odranoel.urudnoc@gmail.com
A PETROBRAS NA VISÃO DE SEU PÚBLICO INVESTIDOR TERIA SIDO VÍTIMA, RÉ, OU REFÉM DE SEUS PRÓPRIOS DESACERTOS NO CONTEXTO DA OPERAÇÃO LAVA-JATO?
31/01/19
Escrito por Leonardo Condurú
DA DÍVIDA DA PB COM OS ACIONISTAS AMERICANOS:
Em fins de 2014, de acordo com reportagem publicada no Jornal Valor, de 09/12/2014, a Petrobras tornava-se alvo de uma ação coletiva nos Estados Unidos em nome de investidores americanos que detinham a posse de ADRs da empresa no período de 5/09/14 a 21/11/14 (58 dias).
O objetivo da ação, movida pelo escritório Wolf Popper, buscava o ressarcimento daqueles acionistas, em razão das perdas com as ações da companhia motivadas (i) pelo desvio de recursos no âmbito do Petrolão, citado nas investigações da operação Lava-Jato, (ii) bem como pelo risco de a Petrobras ter de fazer ajustes relevantes em seus balanços, por conta de superfaturamento na aquisição e construção de refinarias e terminais petroquímicos.
Segundo a agência reguladora do mercado de capitais americano, a SEC (Securities and Exchange Commission), equivalente à CVM brasileira, a Petrobras teria infringido a regra 10b, que trata de “fraude e omissão que permita fraude e induza o investidor a negociar valores mobiliários da empresa com base em informações erradas”.
Nos Estados Unidos as ações coletivas são relativamente comuns. A dinâmica do mercado, porém, é diferente da brasileira. Para o ressarcimento de acionistas americanos, a SEC pode pedir a abertura de uma ação deste tipo a qualquer tempo, mas a ação coletiva pode ser proposta também por qualquer investidor que se sinta lesado.
Na ocasião, os advogados do escritório responsável pela ação inicial nos EUA, afirmavam que não havia como se estimar o valor da causa, mas certamente deveria ser algo girando em torno de centenas de milhões de dólares somente para o período mencionado, de 58 dias, e na hipótese de acordo entre as partes.
Diante dos números apontados e considerando os inevitáveis danos à imagem da Petrobras, que poderiam implicar dificuldades adicionais à empresa junto ao mercado financeiro nacional e internacional, buscou-se aferir naquela data (dez/2014), através de uma apuração prévia dos valores envolvidos, a ordem de grandeza daquelas perdas.
De fato, computando-se o período mencionado (de 58 dias) e o comunicado do escritório Wolf Popper que citava a perda de US$ 8,88 por ADR, chegou-se a números parecidos aos das estimativas iniciais. As perdas da PB com as indenizações pleiteadas se aproximavam dos US$ 704 milhões, utilizando-se para tanto os parâmetros de análise apontados pela matéria do Valor e apoiados em planilha de suporte contendo todas as informações referentes às movimentações de ADRs da PB, negociadas na Bolsa de Valores de NY no período de 04/09/14 a 24/11/14, inclusive.
Como se sabe, a regra 10b foi uma das argumentações utilizadas nas ações coletivas abertas contra Sadia e Aracruz, em 2009, nos Estados Unidos, por conta dos prejuízos bilionários com derivativos cambiais que quase quebraram essas companhias. Para encerrar a disputa judicial, ambas fecharam acordos com a SEC: a Sadia pagando US$ 27 milhões, e a Aracruz, outros US$ 37,5 milhões, a título de indenização aos investidores americanos dessas duas empresas.
Em 2009 eram comuns no mercado financeiro brasileiro operações com derivativos cambiais tóxicos tais como as que vinham sendo praticadas pela Sadia e a Aracruz, que lhes causaram prejuízos de cerca de R$ 2,55 bilhões e R$ 4,3 bilhões, respectivamente. Pouco depois da tempestade cambial, contudo, acabaram sendo compradas por outras empresas: a Sadia pela Perdigão, resultando na BRF, e a Aracruz pela Votorantim Celulose e Papel (VCP), dando origem à Fibria.
Com base nos acordos com os acionistas apontados, as indenizações pagas aos investidores americanos pela Sadia e Aracruz foram, respectivamente, de 2,74%, e de 2,26%, do total de suas perdas com derivativos, conforme mostradas na matéria do Valor.
No caso da Petrobras, analisando-se o volume médio diário de ADRs negociadas no período que ia de 5/09/14 a 21/11/14, versus a perda por ADR (estimada em US$ 8,8), e multiplicado-se o resultado por 58 dias, chegou-se a um montante bruto de perdas da Companhia, da ordem de US$ 25,6 bilhões, para todo o período coberto pela causa conduzida pelo escritório Wolf Popper.
Na hipótese de eventual acordo da Petrobras com os acionistas lesados, o que posteriormente acabou acontecendo, e utilizando-se, tal como ocorrera nos casos da Sadia e Aracruz, o maior percentual de perdas de uma e outra, de 2,74% (da Sadia), chegou-se ao montante de US$ 704,3 milhões, equivalentes, em 2018, a R$ 2,81 bilhões, ao câmbio de US$1,00=R$4,00, para negociação e acordo com a data de referência de 2014.
Com referência, ainda, aos casos de Sadia e Aracruz, foram destinados pelo juiz das causas em questão 30% do montante consignado nos acordos aos advogados dos acionistas. Aplicando-se esse mesmo percentual aos valores apurados no parágrafo anterior, chegou-se ao montante provável de perdas da Petrobras, somente com aquela ação inicial, de US$915,6 milhões, isso em fins de 2014, ou R$3,6 bilhões, ao mesmo câmbio (US$1,00=R$4,00)
DAS PRINCIPAIS CONCLUSÕES SOBRE O CONTENCIOSO DA PB NO MERCADO DE CAPITAIS AMERICANO:
Como se podia perceber, os escândalos em série que envolviam a Petrobras e que vinham sendo publicados em jornais e revistas do Brasil e do exterior, desde o início de 2014, pareciam ter chegado finalmente ao mercado financeiro americano, a princípio como parte dos riscos a que as empresas estão sujeitas ̶ nesse caso, em especial, o risco corporativo, abrangendo diferentes componentes, dentre os quais os operacionais e legais, que compreendem as perdas potenciais resultantes de sistemas inadequados; falhas de gerenciamento; erros humanos; catástrofes ambientais; fraudes, etc.
De acordo com a cronologia daqueles eventos foi possível elencar-se os seguintes principais danos à Petrobras como um todo:
i) impactos nos planos de negócios de empresa, que foram fortemente revistos nos anos seguintes a 2014, em razão dos prejuízos sofridos e dos danos à imagem da Companhia, ainda hoje bastante comprometida.
ii) dificuldades de novas captações de recursos no exterior e também no mercado nacional, sinalizadas pelos fortes aumentos dos juros cobrados pelos títulos da Petrobras no mercado secundário americano (após a emissão), que em certos casos mais que triplicaram de valor, logo depois da ação patrocinada pelo escritório Wolf Popper e pela SEC, independentemente do rebaixamento de sua classificação de risco de crédito (que foi assumida integralmente pelo mercado americano).
iii) risco de perdas potenciais provenientes de novas ações judiciais, agora no judiciário americano, que não se confundem com aquelas, chanceladas pela SEC, como se verá mais adiante.
iv) risco de vencimento antecipado dos títulos da PB negociados nos EUA, em razão da não publicação de balanços auditados.
v) risco de “default”. Embora a Lei de Falências não se aplique a sociedades de economia mista, como no caso da PB, é sabido que no limite mais gravoso de seu endividamento, em 2014 e 2015, a relação Dívida Líquida/EBITDA da PB chegou a superar os 5 pontos. Indicadores de saúde financeira para empresas do mesmo setor onde está inserida a Petrobras tendem a registrar graus de alavancagem entre 2,5 e 3,5, bem abaixo daquele, portanto. Para uma empresa privada, um índice de alavancagem daquele porte, equivalente ao da PB, seria suficiente para quebrá-la, literalmente.
vi) risco de as ações da PB virem a ser excluídas do IBOVESPA. À época, o Governo Federal, acionista majoritário, por pouco não teve que injetar dinheiro na empresa, com vistas a sanear parte de suas dívidas.
DOS ACORDOS DE PAGAMENTO DA DÍVIDA COM OS ACIONISTAS AMERICANOS:
Nos EUA, a vítima tem culpa e é responsabilizada: este foi o título da matéria de Fernando Torres, publicada no Valor de 28/09/18, a respeito dos acordos celebrados pela PB nos EUA para evitar que viesse a sofrer novos processos de corrupção no mercado americano.
Embora os acordos fechados com o Dep. de Justiça (DoJ) e a SEC americanos pudessem vir a se constituir num marco no tocante à aplicação da legislação anticorrupção americana (FCPA), uma vez que punia a Petrobras — uma “suposta” vítima dos malfeitos do Petrolão — lendo-se a matéria com carinho observa-se que o seu entendimento é bem outro: ainda que não fosse uma corruptora clássica das que “pagam suborno a governos ou entidades assemelhadas no exterior para obter vantagens econômicas”, as investigações mostraram que executivos da empresa, pessoas físicas, bem como agentes políticos e partidos, receberam propinas pagas por empreiteiras brasileiras e multinacionais de outros segmentos para viabilizar projetos e obras ligados, em sua maioria, aos avanços da exploração do “pré-sal”.
No desenho mencionado, a Petrobras teria sido apenas uma vítima dos malfeitos do Petrolão. Na prática, contudo, o dinheiro repassado pelos fornecedores aos executivos da empresa vinha de “superfaturamento de contratos” que os favoreciam muito acima das propinas neles embutidas. Portanto, o dinheiro da corrupção, de pagamento de subornos e comissões a superfaturamento de contratos, saía do seu próprio caixa. Nesse contexto, a companhia também teria sido responsável, portanto culpada, por toda a dinheirama derramada no Petrolão, como já se dizia.
Tanto isto é verdade que, nos termos do acordo NPA (Non-Prosecution Agreement), o governo americano abria mão de processos judiciais contra a Petrobras, desde que esta confessasse seus malfeitos e comprovasse mudanças na sua conduta, em especial de melhorias nos controles internos e programas de compliance, o que vinha sendo feito. Mas, em nenhuma hipótese a empresa poderia negar em comunicados públicos essa responsabilização criminal que lhe foi imputada por “violação da legislação anticorrupção americana”.
O curioso dessa história é que os parceiros da Petrobras na esteira do Petrolão, a Braskem, da qual é acionista, e a “sócia” Odebrecht também foram punidas, em condições mais severas, inclusive com o pagamento de multas, através de acordo de leniência DPA (Deferrred Prosecution Agreement). Neste acordo, embora as autoridades americanas não fossem adiante em novas ações judiciais, as duas empresas foram obrigadas a pagar multas de US$3,5 bi (ou R$14bi) e a aceitar auditoria interna, nomeada pelo DoJ, para fiscalização de suas condutas.
Ou seja, direta e indiretamente a Petrobras teria sido exemplarmente punida pelo conjunto de seus malfeitos nas trilhas do Petrolão e da operação Lava-Jato, os quais não foram inteiramente contabilizados, contudo, porque não foram incluídos os superfaturamentos e aditivos contratuais de projetos e obras vinculados ao “pré-sal”, que sangraram o caixa da PB em muito mais do que o até então havia sido apurado, a título de propinas e subornos.
DAS DÍVIDAS DA PB COM OS INVESTIDORES BRASILEIROS:
No Brasil, os investidores da Petrobras, em especial a Petros, que em estimativas conservadoras perdeu cerca de R$7bi na aventura do Petrolão, não tiveram nenhuma indenização direta ou indireta da companhia, em dois pesos e duas medidas de sua atuação em seu País de origem.
De acordo com os números apresentados, somente a título de propinas (equivalentes a cerca de 3% do valor dos contratos), objeto das ações nos EUA, e das baixas contábeis publicadas em balanço auditado de 2014, a conta a pagar atingiria US$7,9bi, ou cerca de R$31,6bi, um número muito próximo das contribuições não honradas da PB com o seu fundo de pensão Petros, estimadas em cerca de R$ 25,5 bi. Mas, qualquer semelhança com o PED Petros teria sido “mera coincidência”?
Estima-se que, considerados os negócios ruinosos de “Pasadena” (US$2bi≡R$8bi)), mais os superfaturamentos de projetos e obras do pré-sal que chegam a mais ou menos R$160bi — segundo Marcelo Odebrecht, respeitavam a proporção de um para cinquenta: de cada US$1,00 de propina, as empreiteiras recebiam cerca de US$50,00 adicionais em seus contratos —, mais os subsídios concedidos nos governos Dilma, via controle artificial dos preços dos combustíveis (R$80bi), ou via gratuidade no fornecimento de insumos energéticos à Eletrobrás (R$12bi), os governos passados, desde 2003, comprometeram o caixa da PB, até então a maior companhia brasileira e latino-americana, e uma das seis maiores do mundo, em cerca de R$ 300 bilhões.
Vale lembrar, que somente agora, em 30/01/19, a Petrobras, em anúncio ao mercado, conseguiu desfazer-se da Refinaria de Pasadena, no Texas (EUA), vendendo-a para a Chevron por US$562mi, preço bem abaixo daquilo que havia sido pago, ainda mais se incluídos os US$685mi, investidos pela empresa em melhorias e manutenção daquela unidade de refino.
Diante da grandiosidade do montante do equacionamento da dívida com os acionistas americanos, o título inicial da matéria de Fernando Torres poderia ser reescrito da seguinte forma; “Nos EUA a vítima que também tem culpa é igualmente responsabilizada”. Um pouco diferente daquele publicado, contudo mais verdadeiro.
De toda esta narrativa pode-se extrair ainda lições valiosas acerca do comprometimento das justiças daqui e de lá. Nos EUA, a celeridade nos processos e a punição dos infratores são regras da conduta proativa do DoJ e o não pagamento de dívidas legais e/ou sonegadas por empresas infratoras da legislação anticorrupção americana, pode implicar até na falência da empresa: “ou paga o que deve, ou quebra”.
No Brasil, a justiça, como regra geral, responde apenas reativamente a eventos dessa natureza. A demora processual pode levar anos a fio tendendo a gerar impunidade absoluta dos responsáveis por eventos de corrupção, como os do Petrolão.
Tempos depois, quando os processos entram na fase de execução vem a desculpa, quase sempre em favor de empresas litigantes infratoras, e em claro desfavor de credores, acionistas e investidores: “não pode pagar o que deve, senão quebra”, o que tende a fazer da Petrobras não só vítima, ou ré, mas também refém de seus próprios desacertos no contexto da Lava-Jato. Num mote da iniquidade jurídica do País e da percepção dos seus investidores aqui e alhures.
* Leonardo Condurú é economista aposentado da BR Distribuidora.
Consultor econômico independente.
E-mail: odranoel.urudnoc@gmail.com