https://www.valor.com.br/carreira/5786033/no-mundo-corporativo-o-erro-e-um-pecado-fatal
Escrito por Leonardo Condurú (20/02/19)
Discordo solenemente quando se diz que "o culto ao erro como parte do processo é restrito a algumas empresas. O Vale do Silício e seu inquestionável ecossistema inovador representam a realidade de um seleto grupo de empresas". Isto não é nem nunca foi verdade. Lá não se cultua nada, mas se tolera tudo, até o próprio erro. O erro corporativo, visto como uma sucessão de falhas que convergem para um insucesso, não é nem deve ser cultuado, mas tolerado sempre que individualizado.
E por quê? Ora, porque todas as empresas do mundo são dirigidas e governadas por humanoides, que são suscetíveis ao erro. A falibilidade que pode conduzir ao erro é inerente ao capital humano de qualquer colaborador, seja trabalhando, produzindo, ou eventualmente errando tentando acertar.
E aí devem ser consideradas as visões críticas de terceiros a respeito do assunto, de modo a se identificar e corrigir falhas ao longo do processo para que o erro não se consolide. Donde surge a máxima, válida em qualquer ambiente: “quem nada faz não erra”, ou é “imune ao erro”. Uma alternativa para mitigá-los pode ser o trabalho em equipes reduzidas que se permitam disseminar a outras em “minutas” cada vez mais elaboradas e assim, sucessivamente, para que em tempo hábil o esforço “das atividades/tarefas” convirja para “a construção de uma cultura de diversidade, culto ao diálogo e, aí sim, de tolerância aos erros”.
Mas, como do texto “no final das contas, todos sucumbem pela cultura de curto prazo e a imposição de sobrevivência da maioria das organizações. Imersas em restrições orçamentárias profundas e com a necessidade de geração de caixa, elas não podem errar. O erro é um drama que gera má reputação para aqueles que falham na empresa”, como contraponto dalguma governança maniqueísta.
Exatamente por razões como esta, que os benchmarks dessa fobia espelham tragédias recentes como as de Mariana e de Brumadinho, em especial, protagonizadas pela Vale, que se aplica como uma luva ao texto em discussão.
Os dirigentes da Vale, premidos pela fobia ao erro, deveriam estar todos com prisão preventiva decretada neste momento de dor e sofrimento do País. Todos eles são sim responsáveis pela cadeia de eventos erráticos que levaram ao "suposto acidente" de Brumadinho, mas que foi criminoso da cabeça aos pés.
A Vale, desde a tragédia de Mariana teve suas ações valorizadas em 250%, mas não se preocupou com a governança e a higidez de uma política de prevenção de acidentes como esse.
Por omissão, negligência e incúria, preferiu laudos e papéis de integridade suspeitos de uma barragem já problemática. Não fosse assim, como poderia então uma barragem desativada, romper-se do nada, sem sinais aparentes de fadiga e nenhum toque de alarme das sirenes, que ficaram "cegas, surdas e mudas", justo quando tinham que funcionar?
Na realidade, uma única, e somente uma, que estava ali para tocar era a "sirene da negligência" pronta para entrar em ação com o toque do "silêncio da morte". Como de fato ocorreu.
A ideia de que se “aprende com os erros” por si só é falsa. A tolerância ao erro não será possível, se não vier acompanhada de estímulos de conduta e de ética corporativas, de modo a ser percebido como algo natural e humano que pode e deve ser mitigado com treinamentos exaustivos, até em jogos corporativos rotineiros. Sedimentada a noção, daí talvez não tenhamos mais tantos benchmarks como os de Brumadinho por aí, em minha humilde opinião.
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