Por Leonardo Condurú (texto revisado em 16/12/20)
A construção do estádio Itaquerão não tem nada de esquisito. Trata-se de mais uma superpedalada fiscal do califado petista agenciada pelo ex-presidente Lula e pelo seu ex-ministro Palocci, em pleno governo Dilma e toda concebida pelo Sr. Andrés Sanchez, então presidente do clube alvinegro.
Se antes a base petista questionava as pedaladas fiscais, via CEF (FGTS), BB (plano safra) e BNDES (PSI), agora ficaria sem novos argumentos de defesa, uma vez que se trata de recursos públicos, sem garantias, direcionados para mais uma bravata petista quase sempre negada pelo então presidente do clube.
Está em jogo aqui a malversação de recursos públicos, da ordem de mais de R$1,2 bilhão, seguramente de origem ilícita, via Petrolão, em operações irregulares que passaram ao largo dos olhos da fiscalização da CVM, do BCB, do COAF, do TCU e da Receita Federal. Aguarda-se até hoje um posicionamento do MPF a respeito.
Segundo a Folha de São Paulo, diário que teria íntimas ligações com o governo petista, o dinheiro para a construção do estádio teria vindo de três fontes:
1) R$ 400 milhões de financiamento do BNDES, em recursos que foram intermediados pela CEF, como agente financeiro do Banco. As garantias para o empréstimo foram assumidas pela CEF já que o clube alvinegro não tinha garantias a oferecer, a menos do pedido explícito do ex-presidente Lula nesse sentido (daí advindo a origem do patrocínio da camisa alvinegra pela CEF, que inaugurava o ciclo de patrocínios do futebol pelo Banco público, em montante muito maior do que o de qualquer outro clube do País patrocinado, posteriormente, pela mesma CEF);
2) R$ 400 milhões provenientes da emissão de Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento (CID) que seriam emitidos pela Prefeitura de S. Paulo, como ajuda da Cidade ao clube alvinegro, mas cuja transação foi questionada pelo Ministério Público, que bloqueou a transação. A emissão de CIDs foi então substituída pela emissão de debêntures, que teriam sido emitidas pela Odebrecht, posteriormente adquiridas pela CEF.
3) R$ 400 milhões em “aporte direto” da empreiteira Odebrecht, como se fosse uma operação com parte relacionada, onde o clube alvinegro seria uma de suas “empresas coligadas ou controladas”. O aporte direto da Odebrecht representou um financiamento bancado por ela própria ao Corinthians como se instituição financeira fosse, o que é vedado pela legislação brasileira.
Quando uma empresa busca o crescimento de suas atividades em iniciativas de médio e longo prazos, como a ampliação de uma fábrica, ou a compra de uma nova linha de máquinas e equipamentos, ou ainda a troca de sua frota de veículos, ela precisaria de capital financeiro.
Dentre as alternativas de mercado disponíveis para se levantar esses recursos têm-se: (i) o financiamento direto junto a linhas específicas de bancos de desenvolvimento (tipo BNDES); (ii) os empréstimos bancários, ou (iii) a emissão de valores mobiliários — títulos de crédito denominados debêntures (conversíveis ou não em ações) — no todo ou em parte do montante requerido para aqueles fins.
As debêntures são títulos de dívida usadas pelas empresas para captar recursos junto ao público em geral, tratando-se, portanto, de uma operação de crédito, onde o investidor nesses títulos passa a ser credor da empresa emissora. E quando a dívida é quitada, nela está incluída uma remuneração adicional ao investidor, que é o seu prêmio pelo empréstimo efetivado.
De acordo com a legislação societária, as empresas chamadas sociedades limitadas não teriam poder para emissão de debêntures. Para tanto, a empresa deve ter seu capital representado por ações e ser uma sociedade anônima. Portanto, apenas as companhias abertas com registro na CVM podem, por meio de oferta pública a investidores, emitir debêntures no mercado de capitais brasileiro.
As debêntures têm uma característica especial em relação a outros títulos de crédito: são uma alternativa de financiamento que precisa da aprovação dos acionistas, ou de companhia controladora, pois sua emissão não pode ser decidida pela diretoria da empresa que busca dívida, isoladamente.
As companhias abertas, na colocação pública de debêntures, devem então seguir alguns procedimentos, como (i) a convocação de uma assembleia geral dos acionistas para autorizar a emissão; (ii) a elaboração de uma escritura de emissão registrada em cartório, com o registro obrigatório dessa operação na CVM; (iii) a emissão e a negociação das debêntures no mercado comprador, de balcão. Além disso, a empresa emissora obriga-se a pagar aos investidores as debêntures no vencimento, na forma prevista na escritura de emissão.
As companhias de capital fechado só podem realizar emissões privadas com oferta a acionistas ou a grupos restritos de investidores que atendam a determinados requisitos.
Usualmente, para poder emitir um título de crédito desta natureza, a diretoria de uma companhia deve obter a concordância dos acionistas, reunidos em assembleia geral. Há a exceção das companhias abertas, nas quais o Conselho de Administração pode deliberar sobre a emissão de debêntures simples, não conversíveis em ações e sem garantias reais.
Um fato sabido, aquele em que o juiz Federal Altair Antonio Gregório, da 6ª vara Federal de Porto Alegre/RS, deferiu liminar, para suspender o patrocínio da CEF ao Corinthians. A CEF assinou contrato de patrocínio de cerca de R$ 30 milhões com o clube paulista para que a marca "Caixa" fosse estampada na camisa do time de futebol.
O magistrado entendeu que, por ser empresa pública, a CEF só poderia fazer publicidade de caráter educativo, informativo ou de orientação social, acatando as regras previstas no § 1º do Art. 37 da CF/88. Segundo ele, o Banco deveria se limitar "apenas ao patrocínio dos temas que promovam a identidade do País, e não de um mero segmento social, como o esportivo-clubístico-profissional, pois, afinal, torcer é ato sectário, diferente do mero admirar ou praticar o esporte".
O juiz também afirmou que o patrocínio do ente estatal ao Corinthians promoveria desequilíbrio econômico entre as agremiações nacionais do futebol profissional.
"A situação aqui é diversa daquela em que a CEF, como fez em Santa Catarina, dispensou patrocínio às agremiações locais (clubes Avaí e Figueirense). Lá se respeitaram as condições de equilíbrio local, patrocinando-se os clubes mais relevantes do Estado e, pois, evitando-se o sectarismo do patrocínio a apenas uma única agremiação regional", ponderou.
Estes fatos de per se permitiram a extensão do patrocínio da Caixa para os demais clubes brasileiros, em montante menor, contudo, do que aquele pago para o clube alvinegro paulista.
O então presidente corintiano, Andrés Sanchez, afirmara por várias vezes que o “estádio do clube não seria construído com dinheiro público”.
Ledo engano: um comunicado no site oficial da instituição confirmava que a Odebrecht, empreiteira responsável pela obra, faria, como fez, um empréstimo junto ao BNDES, uma empresa pública federal, para financiar o empreendimento, com dinheiro público sim.
O contrato entre o Corinthians e a Odebrecht foi assinado na véspera do aniversário de 100 anos do clube (31/08/2010), com um “valor de referência” de R$ 335 milhões. No comunicado postado no site oficial, a negociação é explicada de maneira detalhada.
De acordo com a Nota, para manter fundos durante os quase três anos de construção do estádio, o clube precisaria de um empréstimo com um longo prazo de pagamento.
Como os clubes de futebol, em tese, não teriam credibilidade suficiente para conseguir linhas de financiamento do BNDES, a diretoria do clube alvinegro “procurou uma empresa privada para contrair o empréstimo da instituição” e “encontrou”, por razões óbvias, a Odebrecht, empreiteira então ligada até o pescoço com o governo petista e o Petrolão.
E disse mais a diretoria alvinegra: "depois de várias consultas a grupos privados, a solução despontou quando a Odebrecht — uma das maiores construtoras do Brasil — aceitou nosso apelo para superar simultaneamente os dois desafios: (i) construir nosso estádio a preço justo, e (ii) oferecer ao BNDES o peso da sua solidez econômico-financeira, tendo como lastro os direitos sobre a denominação do nosso estádio", dizia a nota.
Uma pérola de desfaçatez não fosse o pedido formulado pelo próprio ex-presidente Lula, torcedor do clube alvinegro e credor de muitos favores concedidos à empreiteira, no âmbito das obras do Petrolão no Brasil e no exterior.
Aliás, como disse Juca Kfouri, famoso torcedor alvinegro, em vídeo gravado no youtube: “o torcedor número 1 do Corinthians é o ex-presidente Luiz Ignácio da Silva que presenteou a todos os corintianos com o Itaquerão, que nos sairia de graça, não fosse pelo Petrolão e a Lava-Jato, que puseram a nu toda a operação”.
As matérias com as opiniões do jornalista não deixam dúvidas, de como os “gambás” ganharam a arena do BNDES:
Pelo acordo, o clube alvinegro cedeu à Odebrecht os naming rights do estádio por R$ 335 milhões. Ou seja, a empreiteira poderia vender a uma empresa o direito de batizar a arena. Se a receita superasse os R$ 335 milhões, o que nunca ocorreu até hoje, o excedente ficaria com o clube. Por outro lado, caso o valor não fosse alcançado, a agremiação deveria ressarcir a construtora, o que jamais aconteceu.
Em nota oficial, a diretoria do clube dizia que “o estádio do Corinthians terá capacidade para receber 48 mil torcedores, 16 mil em cadeiras cobertas. Além de 225 camarotes, serão construídas 2,1 mil vagas de estacionamento. O projeto conceitual existente será transformado no projeto executivo da obra antes de se buscar o empréstimo”.
"Este projeto executivo será submetido ao BNDES, em busca do financiamento desta obra, dentro dos parâmetros já existentes no Banco para projetos semelhantes, “sem vantagens ou privilégios” (sic). A garantia deste financiamento será de inteira responsabilidade da Organização Odebrecht", continuava a nota oficial.
"O Dr. Aníbal Coutinho (arquiteto) concebeu e detalhou este projeto, aliando funcionalidade e elegância, cumprindo todas as exigências dos manuais da Fifa para se enquadrar como estádio padrão da Copa do Mundo e apto a receber uma final de Copa Libertadores.
O Corinthians espera iniciar as obras ainda em 2010 e finalizar os trabalhos no primeiro semestre de 2013. O estádio foi anunciado oficialmente como palco da Copa do Mundo de 2014.
Para receber a abertura da Copa, o clube precisaria de mais R$ 170 milhões, valor necessário para aumentar a capacidade do estádio de 48 mil para os 65 mil lugares exigidos pela Fifa para o primeiro jogo.
A adequação desse estádio, para o recente anúncio de que o mesmo servirá para os jogos da Copa de 2014 e para sua abertura será objeto de novas avaliações entre o Corinthians e a Odebrecht, sempre visando chegar ao melhor resultado", informava o comunicado.
O estudo de demanda realizado pelo Corinthians atestava que “o estádio teria condições de se pagar em menos de três anos” (sic), já que a arrecadação total projetada era superior a R$ 100 milhões por ano (o que nem perto disso chegou desde que foi inaugurado, diga-se de passagem), afirmava a nota oficial, assinada pelo presidente Andrés Sanchez.
Desde que foi construído, o Itaquerão não havia custado um centavo ao Corinthians, até a eclosão da Lava-Jato, já tendo consumido até aqui cerca de R$1,5 bilhão em verbas públicas nunca resgatadas.
Por conta dessa bravata com dinheiro público, o então diretor de fakemarketing do Corinthians, Sr. Luís Paulo Rosenberg, alardeava aos quatros cantos, inclusive em jornais americanos, sobre o “case de sucesso” da administração do clube, que o salvou da falência e elevou o seu patrimônio a muitos milhões de dólares, num ufanismo desmedido. Algum tempo depois, foi defenestrado da diretoria do clube pelo Sr. Andrés Sanchez.
Somente agora, em 2020, conseguiu-se um patrocínio (naming rights) para o nome do Itaquerão, rebatizado de Neoquimica Arena, mas em valores que não passam nem perto daquilo que dizia o ex-presidente Sanchez.
A dívida com a Caixa nunca foi equacionada e já se negocia um quarto ajuste no contrato de dívida, que permita ao clube “pagamentos mais suaves” nas prestações devidas. O clube corintiano tem dívidas, hoje, que somam perto de R$1bilhão, e nelas não estão incluídas as dívidas do Itaquerão, incorporadas que foram numa espécie de sociedade de propósito específico (SPE).
De acordo com o balanço de 2020, a dívida com o Itaquerão já está próxima dos R$600mi e o clube alvinegro apresentou déficit próximo de R$170mi, o quarto consecutivo.
Então vem a pergunta que todos gostariam de fazer: de onde tirar receita em tempos de pandemia, com a economia em recessão, sem estádios funcionando com público e com patrocinadores do clube cada vez mais distantes?
Como se vê, uma situação que em nada se assemelha ao “case de sucesso” apregoado pelo seu ex-marqueteiro, ao contrário, é muito parecida com as de outros grandes clubes brasileiros, como o Atlético-MG, o Botafogo e o Cruzeiro, este em estágio crítico pré-falimentar. Aliás, com os três alvinegros, o do RJ, o de MG e o de SP, formando no seleto "clube do bilhão", cuja saída não vê luz no fim do túnel.
Não à toa, esses clubes lutam desesperadamente para se tornar clubes-empresa, imaginando ser possível o calote ad aeternum de tributos federais e a zeragem de dívidas, muitas das quais provenientes de malfeitos e gestões ruinosas de seus dirigentes. Esquecem, contudo, que não há investidor pródigo que queira ver seu dinheiro virar pó, nem mesmo aqueles que se dizem torcedores fanáticos de seus times.
Vale lembrar, que o dinheiro público derramado num projeto personalista, como o “case Itaquerão”, veio na esteira da construção, reconstrução e reformas de estádios para viabilizar a Copa do Mundo de 2014 no Brasil, que nada teve a ver com as prioridades de um povo carente de quase tudo, como o brasileiro.
E o presentinho do ex-presidente Lula ao clube de maior torcida de São Paulo, porém aí concentrada, fez de Andrés Sanchez deputado federal pelos PTralhas, ajudando a legenda na reeleição de Dilma em 2014. Passou em branco pela Câmara Federal, como esperado, tornando a se eleger novamente presidente do clube paulista e fazendo seu sucessor nesta última eleição, em 2020.
Em resumo, vejam só! Lá vai seguindo a procissão da pandemia, "cheia de gambás", é fato, mas o Brasil que se exploda na opinião desses bacamartes do esporte e do erário, protagonistas de mais um escândalo com dinheiro público, como sempre acontece.
Lamentável sob todos os aspectos. Cadeia neles! Acorda Brasil!
Comments